Que deliciosa surpresa tive ao pestanejar os olhos na tela do computador e ler mesmo em PDF, sem poder pegar e marcar no livro ( coisa que destesto) O Livro dos Abraços de Eduardo Galeano. Um presente de um companheiro fascinado por Galeano. Que originalidade apresentam os escritos desse homem! Em tão poucas palavras é capaz de contar grandes histórias, brincando com as palavras...
Abaixo lhes presenteio com alguns excertos que extrai de " O livro dos Abraços". Nem terminei de lê-lo, mas já valeu muito a pena ter trocado figurinhas com o Compa Gaucho. Obrigado , moço!
“Celebração da voz humana
Quando é verdadeira, quando nasce da necessidade de dizer, a voz humana não encontra quem a detenha. Se lhe negam a boca, ela fala pelas mãos ou pelos olhos, ou pelos poros, ou por onde for. Porque todos, todos temos algo a dizer aos outros, alguma coisa, alguma palavra que merece ser celebrada ou perdoada”.
“A fome
Um sistema de desvinculo: boi sozinho se lambe melhor..., o próximo, o outro, não é seu irmão, nem seu amante. O outro é competidor, um inimigo, um obstáculo a ser vencido ou uma coisa a ser usada. O sistema, que não dá de comer, tampouco dá de amar: condena muitos à fome de pão e muitos a fome de abraços.”
O diagnóstico e a terapêutica
O amor é uma das doenças mais bravas e contagiosas. Qualquer um reconhece os doentes dessa doença. Fundas olheiras delatam que jamais dormimos, despertos noite após noite pelos abraços e padecemos febres devastadoras e sentimos uma irresistível necessidade de dizer estupidezes. O amor pode ser provocado, deixando cair um punhadinho de pó de me ame, como por descuido, no café ou na sopa ou na bebida. Pode ser provocado, mas não pode impedir. Não o impede nem água benta, nem o pó de hóstia tampouco o dente de alho, que nesse caso não serve pra nada. O amor é surdo frente ao verbo divino e ao esconjuro das bruxas. Não há decreto de governo que possa com ele, nem poção capaz de evitá-lo, embora as vivanduras, apregoem, nos mercados, infalíveis, beberagens com garantia e tudo.
Ninguém nessa vida é unanimidade. Como dizem por aí, numa visão mais religiosa-cristã, “nem Jesus é” imagina se eu iria querer essa proeza.
Somos movidos pelas afinidades... Bem que na física tentaram explicar a atração de coisas opostas... Mas como a física não explica tudo e como estamos abertos a não acreditar e discordar das explicações da ciência, eu discordo então.
Discordo, então, a partir de um ponto de vista: Socialista.
Discordo que tenha que ser benevolente com alguém que faz escolhas pelo sofrimento alheio da/o outra/o que conscientemente explora alguém no sentido de sua sobrevivência.
Discordo que tenha que insistir em estimular mudanças naqueles que já fizeram escolha, dita definitiva, pelo sistema capitalista, que tem no seu cerne a desumanização e a exploração do ser humano por si mesmo.
Discordo que tenha que me submeter a gostar de comportamentos que afirmam esse sistema. Até posso suportá-los... Afinal depois de anos submetidos aos fetiches dele é difícil de nos libertarmos desses comportamentos.
Todavia é bom deixar claro que não discordo de maneira dogmática (imutável), discordo de forma ortodoxa (fiel) e dialogável, ou seja, discordo a partir de um ponto de vista dialógico, dialético e materialista- histórico; socialista, com opção de classe definida- a classe trabalhadora.
Não sou definitivamente dona de verdades absolutas, só defendo as minhas verdades com afinco! E como sou humana, suscetível a erros e acertos, tenho clareza de que as minhas verdades podem estar equivocadas. Estou aberta a reconhecer meus equívocos... É assim que venho caminhando: tentando acertar...
Recrudesce no Brasil um processo de criminalização dos movimentos sociais, organizações e militantes. Isto para bloquear o avanço das lutas por direitos e transformação social. No caso da luta das mulheres não é diferente.
Forças patriarcais tradicionais, constituídas pelas oligarquias, a ultra direita fascista e setores fundamentalistas das igrejas cristãs, nos últimos anos deslancharam um processo de perseguição e criminalização da luta das mulheres por autonomia e autodeterminação reprodutiva atingindo em primeiro lugar as mulheres que recorreram a prática do aborto e aqueles/as que as apóiam.
Numa perversa aliança entre neoliberais e conservadores, vivemos uma conjuntura de cerceamento do direito ao debate democrático sobre a problemática do aborto, ao mesmo tempo em que cresce no Estado o poder e influência destas forças. Ocupam o parlamento, os espaços de controle social e avançam no controle da gestão da rede pública de educação e de saúde, e nesse caso, ameaçando os princípios do SUS com impacto negativo na qualidade do atendimento às mulheres. Dados de estudos e pesquisas sobre a mortalidade de mulheres comprovam que, pela magnitude da proporção de mulheres negras mortas nos serviços de saúde, configura-se num verdadeiro genocídio perpetrado pelo Estado brasileiro contra esta população.
As forças patriarcais, religiosas ou não, atuam também na base dos partidos políticos e movimentos sociais, disputando ideologicamente o debate de projeto de sociedade junto à juventude e à ampla parcela cristã dos/as militantes e dirigentes. Por este estratagema tentam impor sua doutrina religiosa, visão de mundo e visão sobre as mulheres, a sexualidade e a reprodução humana.
A adesão ao ideário conservador no campo da sexualidade e reprodução construiu as contradições que hoje enfrentamos nos partidos de esquerda e nos movimentos do campo democrático popular, que, construindo um projeto libertador, recuam em propostas libertárias quanto à autonomia das mulheres.
Hoje no Brasil, parte dos algozes da inquisição com suas vestes e capuzes tem uma nova face: o paletó, o jaleco branco, a toga, que no legislativo, nos tribunais, serviços de saúde, delegacias se arvoram a prender, julgar, punir e condenar as mulheres que, em situação limites de sua vida, optaram pela prática do aborto como ultimo recurso diante de uma gravidez indesejada.
Temos hoje uma das piores e mais reacionária legislatura no Congresso Nacional desde a ditadura, que ataca os movimentos sociais pela via das CPIs, entre elas a CPI do Aborto, ao mesmo tempo em que aprova a concordata entre o Brasil e o Vaticano, uma ameaça ao princípio da laicidade do Estado brasileiro.
Nesta conjuntura, nós integrantes da Frente Nacional pelo Fim da Criminalização das Mulheres e pela Legalização do Aborto reafirmamos:
- nosso compromisso com a construção da Frente formada por movimentos sociais e setores democráticos brasileiros;
- nosso compromisso com a defesa radical das mulheres e movimentos sociais engajados nas lutas sociais;
- nosso compromisso de não abandonar e prestar solidariedade a todas as mulheres que precisaram recorrer ao aborto,
- nosso compromisso com a construção de um Brasil justo e democrático.
Convocamos todas as mulheres a mobilizarem sua inquietude, rebeldia e indignação na luta feminista em defesa das mulheres;
Convocamos os setores democráticos a somarem-se em aliança contra a criminalização das mulheres e dos movimentos sociais;
Não aceitamos qualquer proposta de plebiscito sobre o tema do aborto. Esta prática não pode ser transformada em questão plebiscitária. Esta é uma questão de foro íntimo de cada uma de nós mulheres. As mulheres devem ter garantida a sua capacidade moral e soberana de tomar decisões sobre suas vidas.
Exigimos dos poderes da República a observância dos Tratados internacionais dos quais o Brasil é signatário e observância das resoluções das Conferências de Políticas para Mulheres, cumprindo a revisão, coordenada pela SPM em 2005, da legislação que pune o aborto e avançando na sua legalização nos termos da proposta consensuada no âmbito da Comissão Tripartite formada pela sociedade civil, executivo e legislativo.
Nenhuma mulher deve ser presa, punida, maltratada ou morrer pela prática do aborto.
Pela autonomia e cidadania de todas as mulheres! Pelo fim da criminalização das mulheres!
Nós mulheres da Paraiba, agricultoras familiares, camponesas, assentadas, trabalhadoras rurais, sindicalistas, trabalhadoras domésticas, donas de casa, estudantes, educadoras reunidas nos dias 27, 28, 29 e 30 de novembro, em João Pessoa, no I Encontro Estadual das Mulheres do Campo e da Cidade, reafirmamos a luta por justiça, em defesa da igualdade e pelo fim da violênciacontra as mulheres!
Entendemos que a forma como a sociedade está organizada coloca a mulher numa situação de violência, opressão e exclusão social, negando seus direitos. Somos as principais vítimas do desemprego, do trabalho precário, dos menores salários e da falta de políticas públicas.
Nossa vida e nosso corpo são tratados pela sociedade capitalista como mercadoria. Continuamos sendo as únicas responsáveis pela casa, pela família e pelo cuidado e educação dos filhos, além de estarmos distantes dos espaços de poder e de decisão.
Denunciamos o patriarcado e todas as formas de violência contra as mulheres. Somos constantemente alvos da violência: moral, psicológica, patrimonial, sexual e física. Denunciamos o não cumprimento da Lei Maria da Penha, que coíbe a violência, pune os agressores e traz segurança para as mulheres. Todos os dias, milhares de mulheres continuam sendo vítimas de violência no Brasil e no mundo. Na Paraíba, este ano, já foram assassinadas 42 mulheres, com 26 sofreram tentativas de homicídio xx estupros
Denunciamos o agronegócio que concentra terras, contamina os nossos recursos naturais, viola o direito das agricultoras camponesas em conservar a biodiversidade e nos tira o direito de produzir alimentos saudáveis.
Lutamos por uma Paraíba com a participação igualitária entre homens e mulheres, por justiça e autonomia das mulheres. Pelo direito de acesso à terra, à água, moradia digna, por soberania alimentar e pelo combate à violência contra a mulher em todas as suas formas.
Exigimos que o poder público em todas as suas instâncias cumpra seu papel de proteção às vítimas da violência, respeitando as mulheres violentadas e garantindo a segurança para seus filhos e filhas. Exigimos também políticas públicas que valorizem o trabalho da mulher camponesa e da cidade.
Precisamos construir uma nova sociedade, pautada num projeto popular, onde a valorização do trabalho seja sinônimo de emancipação e as mulheres tenham autonomia sobre seus corpos e suas vidas.
Vamos continuar nos organizando e lutando até que todas as mulheres sejam livres da opressão, e da violência.
Mulheres do Campo e da Cidade construindo uma nova Sociedade!!!
Sonho com o tempo em que Mulheres e homens se libertarão...
Com o tempo em que o discurso Será expressão da verdadeira prática Com o tempo em que os sentimentos Serão sinceros e abertos Sem precisar dos outros esconder
O sonho que sonho todavia Não deve ser mera fantasia Deve ser por simpatia Conquistado dia a dia Deve ser por alegria Compartilhado em harmonia
E se indignado for Deve romper com as correntes Que sufocam o amor Deve matar o algoz Se torturado for
E com sangue lilás Deixar na história jamais Traçarem planos de dor.
Ângela Pereira. 05 de dezembro de 2009. Clube dos Estivadores. Serra –ES.
Marcaram nossa história com sangue Prenderam nosso sorriso branco em uma gaiola Riscaram nossa carne com brasa Achando-se superiores
Assinaram a lei Áurea Querendo diminuir o peso da culpa histórica Mas não passou de mera oratória E assim se faz a história.
Com navios negreiros Com chicotadas violentas Com famílias desfeitas Com sonhos apagados Com corpos tombados
Rejeitaram nossa linda cor Como se fosse anormal Nos puseram alcunhas Num desrespeito total Nos fizeram substituir o cabelo crespo Por outro artificial
Mas Zumbi ensinou E a história marcou Com a força de Dandara Muita luta travou
É tempo de fincar pé Lembrar as opulências Do inimigo carrasco Mas de cabeça erguida Permanecer na resistência Aclamando a liberdade
É tempo de fincar pé E a essa luta juntar Mais que identidade negra Já que a força negra Também é proletária
É tempo de fincar pé Gritar em alto tom: Sou negro sim! E carrego comigo o grito da liberdade Sou negra sim! Quero a verdadeira liberdade
Que somente a revolução proletária trará.
Ângela Pereira. 20 de novembro de 2009. Aeroporto de Brasilia, rumo ao Curso de Economia Política e Desenvolvimento Agrário em Vitória-ES.
Do negro corpo transcende um som forte Do beijo de Oxum... Beleza da lua-noite Barulho das águas doces...
Do negro corpo sentir o momento Chamar Xangô sem brigar Com Oyá e Obá Espaço para todas há
Do negro corpo que ansia liberdade Quero carícias Leveza solitária... Beleza libertária...
Do negro corpo que rompe o silêncio Com sussurros Quero o momento... De revê-lo por dentro... Despindo as vestes de Oxum E compartilhando o prazer que a natureza ofertar...