jueves, 16 de diciembre de 2010

Elegia a uma pequena borboleta- Cecília Meireles


Como chegas do casulo

-inacabada seda viva!

tuas antenas- fios soltos

da trama de que eras tecida

e teus olhos, dois grãos da noite

de onde o teu mistério surgia

Como caíste sonbre o mundo

Inábil, na manhã tão clara

sem mãe, sem guia, sem conselho

e rolavas por uma escada

como papel penungem, poeira

com mais sonho e silêncio que asas

Minha mão tosca te agarrou

com uma dura, inocente culpa

E é cinza de lua teu corpo,

meus dedos, tua sepultura

Já desfeita e ainda palpitante

expiras sem noção nehuma

- Ó bordado do véu dia,

transparente anêmona aérea.

Não leves meu rosto contigo:

leva o pranto que te celebra

no olho precário em que te acabas

meu remorso ajoelhado leva!

Choro a tua forma violada

miraculosa, alva, divina

criatura de pólen, de aragem

diáfana pétala da vida!

Choro ter pesado em teu corpo

que no estame não pesaria.

Choro esta humana insuficiência:

- a confusão dos nossos olhos

- o selvagem peso do gesto

cegueira- ignorância-remotos

instintos súbitos- violências

que o sonho e graça prostam mortos

Pudesse à éteros paraísos

ascender teu leve fantasma

e meu coração penitente ser a rosa desabrochada

para servir-te meu e aroma

por toda a eternidade escrava!

E as lágrimas que por ti choro

fossem o orvalho desses campos

- os espelhos que refletissem

-vôo e silêncio- os teus encantos

com a ternura humilde e o remorso

dos meus desacertos humanos!
Cecília Meireles









No hay comentarios.:

Publicar un comentario