Apesar de estar afastada do ativismo da militância social, continuo muito inquieta com toda a conjuntura econômico-social e política por qual passamos e, realista, tendo a não florear a realidade. Muitos 8 de março virão: confusos, fetichizados e festejados por muitos/as, especialmente pelos donos de grandes empresas capitalistas e por homens e mulheres que reproduzem o discurso do capital. Virão como sinônimo de luta, também, mas ainda para poucas mulheres que entendem a conjuntura, sabem do conteúdo histórico-político desse dia para a atual condição das vidas das mulheres em todo o mundo.
Embora devamos reconhecer que as mulheres atuais diferem bastante daquelas com posturas recatadas e submissas das senhoritas e senhoras de outrora , tendo uma postura pró-ativa nas suas vidas, buscando sua autonomia emocional e material, os tempos são confusos e entorpecem muita gente com discursos de que as mulheres já conquistaram espaços demais na sociedade e que têm poder sobre o próprio corpo.
A entrada das mulheres no mundo do trabalho não foi conquista das mulheres, embora se repita isso em alto e bom tom nos quatro cantos do mundo. Num mundo em que a ganância pelos lucros e pelo enriquecimento de poucos, as mulheres trabalhadoras foram empurradas para as fábricas e demais setores, posteriormente, pela necessidade de ampliação e exploração da força de trabalho. Com uma força de trabalho barateada e com jornadas de trabalho desumanas, mulheres foram introduzidas na produção sem contudo, lhe fosse retirada o papel central no processo de reprodução do capital.
O capital passa a explorar a força de trabalho das mulheres nas fábricas e desresponsabiliza-se de investir na reprodução dessa força de trabalho, cabendo assim às mulheres o papel de cozinhar, lavar, cuidar dos filhos e de idosos e parcela da reprodução biológica de mais trabalhadores e o lazer de homens com vidas subsumidas ao trabalho .
A divisão sexual de trabalho que antes existia apenas no espaço privado ( domicílios) amplia-se para o espaço público da produção. E a mulher acumula tarefas na produção e na reprodução do capital.
É bem verdade, que as lutadoras sufragistas introduziram a mulher no mundo oficial da política tendo direito a votar e ser votadas. Bem sabemos, entretanto, que esse espaço é limitado pela expressão da sociedade atual. Como a base material da sociedade, continua expressa numa ideologia burguesa, patriarcal e conservadora, o que temos, no Brasil hoje, são bancadas cada vez mais conservadoras e reacionárias que tem tentado e, infelizmente, conseguido retroceder nos direitos das mulheres conquistados com tanto ardor. Então hoje, questiono-me , nessa conjuntura, até que ponto vale disputar a construção de uma reforma política para ampliar a participação das mulheres no parlamento enquanto a consciência,determinada por essa base material, de trabalhadoras e trabalhadoras (comprada ou não) tem elegido homens como Marco Feliciano, Kátia Abreu e similares.
Seguindo...Concorda-se que as mulheres hoje estão em grande números nas escolas e centros de formação universitários e que hoje ser cantora não lhe dá necessariamente o atributo de prostituta. Mas que muitas prostitutas também já não recebem o atributo como tal, já que a prostituição velada acontece muitas vezes dentro das próprias relações monogâmicas em que o casamento confere aquisição do contrato matrimonial, o controle sobre o corpo da mulher como propriedade.
Controle esse ainda mantido pela religião que abomina e sataniza as mulheres que abortam mesmo em caso de estupros degradantes de almas femininas . Controle da mídia burguesa que veicula imagens de corpos femininos para serem vendidos às mentes masculinas e femininas como dignas de serem consumidas, juntamente com os carros e motos, com as cervejas e mais uma gama sem número de produtos.
Controle pelos pangadões musicais que reduzem às mulheres a objetos sexuais . Inclusive aqueles cantados por mulheres que se acham poderosas quando na verdade estão a jogar água no moinho da opressão e confundem tantas outras mentes, reduzindo o poder das mulheres ao poder do pussy. Popozudas iludidas seguem criando conflitos entre mulheres da mesma classe trabalhadora, sob o hit " Beijinho no ombro", enquanto deveríamos estar nos unindo, TODAS, contra as opressões racistas, homofóbicas, patriarcais e capitalistas.
Não menos alarmante, a violência de gênero segue sendo uma das expressões maiores da questão social e da ideologia machista na vida das mulheres. Os estupros coletivos borbulham no oriente médio e no ocidente "civilizado" a exemplo do Caso de Queimadas ( Paraíba) e New Hit ( Bahia). Casos que chocaram a sociedade, todavia, não tiveram resoluções exemplares que precisam ter.
Seguiria, listando, as inúmeras situações que expressam a condição das mulheres nos dias atuais, mas essas linhas já apresentam alguns dos dilemas centrais.
São as pistas de que precisaremos ainda de muitos 8 de março para , numa perspectiva revolucionária, suplantar um modelo de sociedade que tira a liberdade de trabalhadores, mas sobretudo das mulheres trabalhadoras.
Por isso, seguiremos em luta até que todas sejamos livres!
Ângela Pereira.
A poetisa registrou nos seus rascunhos: Está liberado o carpe-diem! Enquanto a liberdade não chega. Por Ângela Pereira.
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